quarta-feira, agosto 12, 2009

SEM #13
Não preciso de tradução. Não percebo uma palavra do que se diz, mas sei exactamente o que se passa, o que se sente. As crianças são iguais em todo o lado.
Abraçada pela mãe, a menina, cinco anos talvez, observa o braço enquanto lhe tiram sangue. Não se queixa e brinca com o penso que lhe põem no braço, com bonequinhos. Chegou a vez do irmão, que esperava lá fora com a avó. Os gritos que há muito se ouviam entram pela porta e intensificam-se. O miúdo, dois anos mais velho, grita e implora à mãe que não o obrigue a tirar sangue. Chora o mais que pode. A mãe agarra-lhe o braço e aponta para a irmã, diz-lhe algumas palavras sérias e o rapaz, não deixando cair a sua máscara choradeira, olha com atenção para o penso da irmã e finge que isso não o acalmou. Continua a berrar. A avó olha para mim e, com um sorriso, encolhe discretamente os ombros, enquanto dá miminhos à neta no seu colo.
A mãe senta o filho no seu colo e abraça-o. Ele não deixou de berrar com toda a força que tem. A enfermeira pega-lhe no braço enquanto se encontra distraído, mas não demorou até ele o retirar com força das suas mãos. A mãe pega-lhe no braço e devolve-o à enfermeira. O miudo berra. A agulha prepara-se para entrar e, assim que entra, o miúdo tenta, em vão, gritar ainda mais, mas os seus pulmões já estavam a dar o seu melhor.
A mãe pede-lhe então para cantar consigo. E ele canta. Baixinho, sem tirar os olhos molhados do seu braço, canta numa voz de criança doce, sozinho, a canção que a mãe lhe pediu. O ambiente acalma e já conseguimos ouvir os nossos pensamentos. Torna-se, finalmente, agradável aquele lugar, em paz, a ouvir uma criança cantar alguma música tradicional, quem sabe, do seu país. Não era uma canção pequenina e ele não esqueceu a letra. Mereceu palmas quando terminou. A mãe pede-lhe mais uma, para que não se distraia e volte atrás. Ele canta. E não se ouvem mais gritos por perto. A infância faz-nos sorrir.

2 comentários:

ADEK disse...

Queria sentir e viver coisas parecidas...Pq não me levaste ctg?*

Neowolf disse...

Gostei muita da descrição que fizeste, que me transpôs, por um breve período, para essa sala localizada em terras distantes, e que me permitiu fazer parte desse ambiente!
Continuação de boa estadia!