segunda-feira, março 24, 2014

Ando com uma vontade crescente de dizer palavrões. Parece-me que é verdade, aliviam.
A culpa é da estrangeira que me pediu para os ensinar. A maioria deles disse-os pela primeira vez em voz alta.

Tanta coisa que deixei por estrear.

Silver Portrait

Perdi o retrato... Queria usá-lo, como ela sugeriu, e pôr um pouco de mim daquela altura. E agora não encontro. Perdeu-se. Ficaram apenas as palavras trocadas sobre o assunto.
O nó do epigastro já se começa a instalar. Lembra não fizeste nada hoje e tenta trazer de novo a culpa. Não há culpa, há cansaço. Mas, enfim, o nó não desata assim com facilidade. Amanhã é um dia novo. É preciso dormir, repor níveis de coragem e força. É preciso paciência. 
E é preciso não lembrar os dias que faltam para me sentir um pouco mais só. E, depois, mais um bocadinho. E depois, de novo, um pouco mais. Até restar apenas eu e a formalidade.
Ai de ti que não me escrevas.

Cada vez mais confusa a amálgama de frases que junto. Eu sei. Fica apenas a minha memória e algum sentimento vago de libertação.

sexta-feira, março 21, 2014

A Barriga Desta Mãe

Soube, quando ele o disse, que já fora longe de mais. Senti-o retinir cá dentro, lá no fundo do epigastro. Isto não é poupar-me. Não é reservar os poucos neurotransmissores que ainda me sobram para conseguir trabalhar o resto do dia. Foi tudo bem espremido naquele momento para que ele o pudesse dizer. Disse-o e ficou, talvez, mais leve. E eu carregá-lo-ia o resto do dia. 
Tenho o trabalho aberto há horas no fundo do ambiente de trabalho e o mal-estar a crescer por não o conseguir adiantar. Eu poderia fazer tanto e tão bem. Mas hoje não. Hoje fiquei por ali, quando ele o disse.
É como o cristal...
Tenho muitos trabalhos para casa. Reduzir o obrigada, o desculpa, o suposto, o devido, a culpa. Aumentar a ajuda, o orgulho, o cuidado, a paragem, a fuga, o prazer. Tudo isto enquanto trabalho. Vai correr bem, vai.
Eu que sou boa, o que tenho para dizer?

quinta-feira, março 13, 2014

Beijocas

Posso tentar, talvez. A Virgínia diz que é possível. E tem de o ser. Uma coisa apenas, por dia. Um doce, uma alegria, uma surpresa. Um registo apenas, por dia.

Diz ela que preciso de beijocas. Dá-me umas quantas, mas lembra que não são as dela que fazem mais efeito. E reforça, a quem de direito, que preciso de beijocas.
Só de ouvir o termo sinto-me um pouco melhor.

quarta-feira, março 12, 2014

Fumo

Agradeço-te o momento. Trouxeste o chá e cheirava a canela. A repousar na tampa do termo, que te serve de recipiente, o chá fumegava. A minha cabeça cansada observava, por já não ter combustível para intelectualidades e pensamentos complexos. Fugi para aquela imagem e pensei, queria tanto conseguir descreve-lo. Assumi a incapacidade e admirei apenas. O chá fumegava e o fumo elevava-se determinado, torneava e contorcia-se, dava cambalhotas, ondeava, desenhava uns cogumelos que se expandiam logo à saída do recipiente mas que dificilmente se distinguiam instantes depois, no seu percurso vertical. Há pressa, talvez, há velocidade, movimento, dança. Nesta imagem, há um tampo de uma mesa castanha por detrás deste vapor que o faz sobressair e que me permite assistir em primeira fila à dança ascendente. O chá está muito quente. Aos poucos arrefece e, lentamente, o gesto fumegante tranquiliza, adelga-se e não desleixa a fluidez do movimento.
Gosto das coisas simples. Gosto de saber que ainda tenho em mim a capacidade de me encantar com coisas simples.
Gosto do teu chá. Talvez da próxima o chegue a provar.