terça-feira, agosto 29, 2006

Já passou o efeito Paredes de Coura. Ainda permaneceu alguns dias, mas acabaria, mais cedo ou mais tarde, por desvanecer. Ficam as memórias, a que posso sempre voltar, e o desejo de repetir.

Já estava aquecida, os concertos desse dia foram bem vivos e animados, a vontade de gastar energias com pulos, danças e risos crescia. Esperava com expectativa o próximo concerto, mas nunca julguei vivê-lo assim.
Bastou a entrada dela em palco para me render. Bigger than the sound. Os gestos lentos, as danças livres, a voz determinada e marota, a presença dominante em palco, é impossível descobrir o que me seduziu. Não via mais nada. Começaram com uma das poucas músicas que conhecia e, ao contrário de todos os outros concertos a que assisti, bebia cada nova música como se não quisesse que terminasse, aprendia-a logo, não me limitava a ouvir o ritmo e dançá-lo, não esperava por outra já familiar, todas eram perfeitas para o momento. De certa forma, algo em mim já as conhecia. Estava a assistir a uma das minhas bandas favoritas do momento sem o saber, o choque de compreender isto durante o espectáculo ao vivo tornou o meu fascínio, que acabara de nascer, ainda maior.
A certa altura reconheço o início da música que mais ansiava por ouvir, mas que julgava que seria esquecida. Êxtase. O meu corpo salta sozinho quando a música lhe diz para o fazer. E eu sigo, pulamos os dois, qual de nós mais inebriado.
Sentia-me tão feliz. Não sei como consegui pensar, mas o que é facto é que o fiz. Estes dias tinham corrido tão bem. Senti-me tão livre, tão leve, sorri, olhei o céu, visitei, conheci, dancei, ri, toquei, senti. E ali, naquele concerto, tudo de resumia naquele momento em que me perdi em mim e na música. Começou a chuviscar, vi tanta cabeça cobrir-se - só me devo ter apercebido da chuva com esta imagem colectiva -. Não lhes segui o exemplo. Ergui a cabeça para o céu, deixei-o pingar sobre a minha face. É isto que Eu Sou. Estou a sê-lo. Esta alegria, esta liberdade, esta vida. Sentir cada instante como se fosse único - e não o é?! -, marcá-lo em mim, deixar-me ir, perder-me nele, ser sugada pela sua brevidade, deixar o peito arder por dentro. Isto é felicidade.
A música terminou e lá me rendi ao capucho. Por pouco tempo porque deixou de chover. Não faz mal, já tive o meu momento abençoado. Voltei de novo a minha atenção para ela. Mantinha-se no seu papel de extravagante e comandante de todos nós. De mim, pelo menos, seguia-a com atenção, se saltasse, saltaria com ela, se se tornasse louca, enlouqueceria com ela. Mas eu sabia que ela iria acordar para nós. Eu não era a única invadida por aquele espectáculo, aquela energia, aquele impulso para mexer. Ouvi-a rir-se. Já nos viu, já percebeu que não gostamos apenas de receber, mas adoramos dar algo de volta. Algo maior para que a festa seja geral. Ela deixou de ser apenas alguém em palco, ela está connosco, comanda-nos com o seu encanto peculiar e move-se connosco. Estamos todos juntos, quebrou-se o fosso que nos separava. Ri-te, canta para nós, dança connosco, you're something like a phenomena.
O concerto não termina nunca. Quero que este momento seja eterno. Observo-a e acredito que também não se importava de ficar aqui connosco para sempre. Canta-nos a sua love song. Absorvo-a tal como me é oferecida. Tal como todas as outras que já passaram. Estou cheia. Perdi a noção do tempo, sugar cada instante estica-o até ao infinito, dá-me a eternidade que queria. Estou feliz como havia muito tempo que não estava. They don't love you like I love you. E, agora sim, estou pronta para voltar.