quinta-feira, dezembro 28, 2006

Não somos um só. Não nos fundimos, não esquecemos o resto do mundo, não morremos um pelo outro. É tudo mentira. Não somos um filme de cores torradas e gestos lentos. Não nos vejo de perto num calor único e eterno. Vejo-te apenas a ti, demasiado perto para te reconhecer. Vejo a ponta do teu nariz e os pêlos da tua face a nascerem discretos. Estás demasiado perto, não consigo ver o mundo. E agora, meu bem, acabou-se. Vim ver como seria se tudo fosse como no ecrã e descobri que não é. É mentira. Não há certezas nem eternidades, não há promessas loucas nem pureza nos actos. Eu tentei embriagar-me no que me faziam crer ser real, mas não chegou. Adeus, meu bem. Afasta-te depressa para que não veja mais o nascimento vagaroso dos pêlos da tua face. Afasta-te para que veja de novo os teus olhos num contexto de cara e os possa fixar e dizer-lhes palavras sinceras de amizade. Afaste-me um pouco mais para que veja onde estou e quem me esperava aqui perto. Se estiveres longe o suficiente, sou capaz de te mostrar aquilo que sempre foi meu e que, por pouco, ia perdendo. O meu coração arde, mas não é por ti. Não é por este aperto sufocante. É por eles. Alguns deles. São eles que me dão vida, que me constroem e destroem, são o que os filmes confundiram por essa exclusividade. Podias um dia ter-te tornado um deles, se ao menos não te tivesses chegado tanto. A culpa não é tua. Também quis conhecer algo mais – porque falam tanto?! –, mas não sabia que era aqui que devia procurar. Hoje compreendo. Adeus, meu bem, vou voltar para eles. Fico só, sim, mas se fizer o que tiver de ser feito por eles, fico bem. E eu nunca te chegaria. Adeus.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

Poemas/Prendas de Natal

Sabes porque chove?
Não, o céu não é egoísta
nem o mundo te quer mal.
Chove porque chove,
Porque o dia assim o pediu.
Enrosca-te no calor da casa,
Fecha os olhos e sorri.
Chove porque chove
E a vida espera por ti.


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Não existem sonetos,
nem quadras, nem rimas,
Que compreendam a alegria
de rever o sorriso saudoso
Que rompe distâncias
e torna o tempo moroso
Fica comigo esta tarde
Num café onde possamos rir
Vamos revistar as nossas vidas
Hoje não temos que sair


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Se o dia despertar negro,
Recorda beijos de olhos cerrados
Se receberes palavras árduas,
Saboreia melhor as doces
Se chover onde estás,
Dança ao som de Jobim
Se te sentires só,
Já sabes, chama por mim.


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Há quem se conforte apenas
Nas memórias doces de um tempo passado
Há quem se afogue na mágoa falsa
De não ser mais que um baú encerrado
Mas há quem conheça outra fortuna,
A das horas e dos dias abertos,
Onde se declaram sonetos de amor
À vida, ao Ser, aos prazeres secretos
E tu, que oiro possuis?

terça-feira, dezembro 26, 2006

Reflexões sobre o Natal e Ano Novo - ano 06

Este ano decidi acreditar que cada desejo de boas festas apregoado em cartazes nas ruas, em anúncios de televisão, em centros comerciais e por aí adiante se destinavam mesmo a mim. Quis parar para ler bem o que lá estava escrito e pensar, foi para mim que o escreveram, pensaram em mim quando decidiram desejar as boas festas. Sinto-me logo mais bem disposta.
E posso falar de prendas, outra vez. Acho que só este ano me apercebi exactamente do negócio. Isto porque no dia em que decidi dedicar-me a arranjar as prendas que gostaria de oferecer encontrei coisas muito engraçadas, mas apercebi-me que eram apenas engraçadas porque eu precisava de arranjar prendas e que não seriam minimamente úteis ou significantes fora da época. Há realmente coisas muito engraçadas nesta altura, aí está o negócio. Portanto, fiquei muito deprimida nessa altura e decidi revoltar-me. Não comprei prendas para quase ninguém. Tive outras ideias...
Chegaram as vésperas e deu-me uma vontade imensa de dizer a quem estimo o quanto gosto delas. Quis abraçar gente que nunca tinha abraçado antes (e porquê?). Eu sinto o espírito de Natal, o meu espírito, que pode ser bastante diferente dos outros. É para se dizer o quanto se gosta das pessoas e estar em família, não é?... Sim, disse a algumas das pessoas a quem queria dizer. Não abracei nenhuma delas.
E chega esta altura e começamos a rever mentalmente o ano que agora termina, já que não podemos analisar bem o que vem aí porque só vai começar agora. Este foi um bom ano. Bem melhor que o ano passado, que foi terrível para mim. Lutei por algumas coisas, consegui algumas, outras serão terminadas no próximo ano e poucas ficaram para trás. Estou satisfeita.
Tinha pensado em fazer aqui uma selecção dos melhores concertos deste ano. Fui a muitos, nunca tinha ido a tantos e tão importantes. A música é muito importante para mim, cada vez me apercebo mais disso. Um concerto hipnotizou-me completamente pela novidade, pela energia, pelo local, pelo contexto, por tudo, deixei de fazer sentido por uma hora e tal. Noutro concerto cumpri uma grande promessa feita a uma menina pequena há já dez anos. Saltámos e vivemos as duas juntas, não uma vez, mas várias, e agora a minha pequena amiga já vai descansar melhor e sentir-se mais feliz e real. Ela chorou, pobrezita, quando se sentiu real. Foi muito especial para nós. E, finalmente, no concerto da minha vida (acho que posso dizê-lo), revivi uma altura muito importante para mim, entreguei-me às memórias, às descobertas, às vivências intensas dessa época. Esse tempo é, talvez, o maior responsável por aquilo que sou hoje e a música recordou-me o quanto estou grata por isso. Estou tão grata. Vivi tanto aquele concerto, nunca me tinha acontecido. Calculo que saibam os músicos presentes em cada um destes concertos que referi...
E, finalmente, a escrita. Este ano foi tão importante para a afirmação da escrita como a minha arte (cada um tem a sua, digam o que disserem). Acredito que me descobri de novo na poesia (e tenho de agradecer a uma pessoa em especial que inconscientemente me "obrigou" a redescobri-la) e a prosa está pronta para ser testada em termos mais seguros e determinados. Termino o ano com vários projectos promissores em mãos e que me trarão novas revelações. Queria contar-vos tudo agora, mas não posso, é tanto e tão importante que prefiro guardar a surpresa para o momento oportuno. Espero que o próximo ano me traga muitos desses momentos.
Concluindo... dei muitos passos em frente este ano. Não posso parar agora. O ano é muito grande, há muito a fazer, há muito a evoluir e a conquistar. E estou a sentir cada palavra que aqui escrevo.
Páro agora para pensar em todos os que sei que passam por este blog. E, agora que já vos revi, desejo-vos (porque sei quem são) um ano 2007 tão formidável como se compromete hoje a sê-lo. Fiquem comigo, celebrem-no comigo quando chegar a altura. Carpe Diem.
Até muito breve,

Laura Brown

sábado, dezembro 23, 2006

Agora tem de ser segredo, se alguém me apanha estou tramada. Tenho de estar com atenção, não posso cair no erro de dar pistas. É tão difícil esconder um sorriso, felizmente ninguém volta para trás para confirmá-lo. Oh, vida, quem diria... Dizia eu, todos os dias, para me poder levantar da cama e seguir pelas horas adentro à procura da Hora. Não sei se já chegou, mas é algo novo. E é segredo. E é medo, e é terror por não saber ser, por nunca ter sido, por não saber fingir saber ser. Medo precoce. Mas tenho sempre o sorriso inconsciente e o sinal atrás da orelha.

domingo, dezembro 10, 2006

Eu explico:
Eu tenho escrito, sim, não me esqueço disso. Só que o que tenho escrito são coisas para projectos específicos e que não posso pôr aqui. O último post foi apenas um texto que escrevi para não deixar este blog muito tempo sozinho. Eu prometo que até ao fim do ano eu ponho algo decente, mas preciso da vossa compreensão para esta ausência incómoda. E também fica prometido que assim que tiver os tais projectos terminados, bem bonitos e arranjados, eu mostro aqui! Até lá...

Laura Brown

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Filo fax. Hora de sair de casa, já com algum atraso. Tranco a porta antes de ir andando para ter a certeza que não me esqueço das chaves. Volto a entrar antes disso para confirmar se o gás está desligado. Agora sim, desço pelas escadas, fecho a porta do prédio que quase de certeza está aberta. Subo a rua. No café, lá está a senhora de idade sentada na mesma cadeira, à mesma mesa, a olhar para quem passa, com os pés em cima da outra cadeira e com um café por perto. Pela roupa que traz, bem que poderia estar em casa. Talvez esteja. Continuo a subir. A escola primária está cheia de crianças eléctricas. Os rapazes assustam-me com algumas brincadeiras que têm. Não há tempo para olhar para as inocências a serem quebradas. Primeira passadeira, não costuma vir ninguém, segunda passadeira, não desvio o olhar enquanto não chegar ao outro lado. Continuo a subir. Terceira passadeira, a mais assustadora. Há carros que não param, há carros que ameaçam parar, há carros que param muito em cima. Geralmente começam a parar lá atrás, mas só avanço quando tenho a certeza que estão a dar-me passagem. Paro a meio para ter a certeza que não vem ninguém na segunda faixa, para que não aconteça como certa vez. Passei finalmente. Primeiros semáforos. Vermelho para mim. Olho para as horas expostas na rua, 9:53. Estou a tempo. Olho para o ecrã também lá perto, vejo as notícias e o cartaz. Os carros à minha frente param e avanço até à próxima faixa que está a andar. Está verde na passagem seguinte, infelizmente tenho de esperar que estes muitos carros parem. Cá está, verde finalmente para mim e o seguinte, que há pouco estava verde, fica vermelho. Carros da direita passam à minha frente, eu espero, não há pressa, tenho tempo. Fica verde para mim, mas ainda há carros a passar, uns poucos. Passei a estrada. Quarta passadeira, costumam parar. Chego à entrada lateral do hospital, digo “bom dia” ao segurança (ele fica tão contente, responde com um “bom dia” muito seguro e sério, mas no fundo, no fundo, sente falta dele quando eu não levanto a cabeça). Camiões a entrar e sair do hospital por aquela porta, tenho de lhes dar prioridade porque o espaço é estreito e não quero meter o pé na lama. Subo o caminho pela esquerda, chego a parte do estacionamento. Vem o cheiro às laranjas que estão nas árvores por ali espalhadas. Sabe bem, para contrastar com o cheiro a escape de há pouco. Vou pela estrada alcatroada para não ficar com os sapatos sujos. Há poças de água e carros na minha direcção, mais uma vez dou-lhes passagem porque não quero pôr o pé na água. Não há problema, chego a horas. Quando existe finalmente passeio do meu lado esquerdo, subo para lá e sigo, já sem contratempos, até ao Edifício. Gente a fumar à porta, de bata e ar novo, mas maduro. Alguns conhecidos dispersos dentro do edifício. A sala está aberta, olho o relógio na parede da esquerda, 10h em ponto, entro na sala e começa o dia.

segunda-feira, novembro 20, 2006

[...] Não, não chorei nesse dia nem nos que se seguiram. Para ser franca, não me recordo bem dos dias seguintes. Lembro-me do silêncio, lembro-me do meu pai deixar de ter o olhar vazio do dia anterior e de o encher de desprezo por mim. Não me lembro de ouvir a sua voz dirigida a mim. Lembro-me da senhora que cuidava da nossa casa se dirigir a mim, dizia-me que o almoço estava servido, que o jantar estava servido, que o meu pai já tinha saído, que o meu pai estava no escritório e que não queria ser incomodado, que tivesse calma com o meu pai, que tivesse cuidado comigo. Lembro-me que era a única que me tocava, abraçava-me quando o meu pai saía, como se tivesse medo que eu o quisesse seguir. Não me lembro de mais ninguém. Não me lembro da cerimónia, não me lembro da família, não me lembro dos telefonemas nem dos cartões. Lembro-me só do silêncio e dos dias azuis. [...]

[um pequeno excerto de um longo projecto que tenho em mãos desde Agosto. O resto só será divulgado quando estiver tudo terminado. Ainda vai demorar.]

sábado, outubro 28, 2006

Hoje acordei-me ao espelho e era feia

E se eu fosse uma farsa?
E se eu fosse uma falsa optimista,
Um sorriso conveniente, uma piada triste?
[...]
E se eu fosse fraca em vez de forte,
se fosse cega em vez de visionária,
se fosse fria em vez de amiga?
O que seria de mim
se um dia todos acordassem
para essa realidade em que sou
uma farsa?

Ele sabe que sim.
Atira-mo à cara sempre que pode
Ri-se de mim
Como todos aqueles que apenas me vêem passar o fariam
se descobrissem o que tento ser
Poeta?! Quem diria...
Tão mortinha e insonsa
Uma tola de queixo arrogante
Que julga apagar a sua vergonha
(tão grande, tão grande)
ao escrever sobre ela...
[...]
Escreve para te lamentarem
Porque o farão, sem dúvida,
aqueles que ainda não viram
a farsa que és
Pensas neles[..]?
Eles são reais, como o teu amor por
alguns
deles, mas tu não o és.
[...]

Porque hoje acordei e, logo de manhã, vi-me ao espelho
Tinha-me deitado bela, com os olhos azuis no seu lugar
E acordei num espaço cru e real
Em que tudo eu sou corpo desarrumado

Caeiro, confio em ti para tornares este
poema em poema.

Vou dormir que é melhor...

[e terminaram por agora este tipo de poemas, não são um bom cartão de visita para ninguém]

sábado, outubro 21, 2006

[Este próximo texto talvez não desse vir para cá porque parece-me que se vai juntar a um projecto que tenho em mãos que anda a avançar lentamente, mas de uma forma muito interessante. Porém, gostei de o escrever e como se afasta ligeiramente do restante projecto, aqui fica, também para aguçar o interesse - eia, até já penso em marketing! -. Cá fica então.]

Seguias de olhos baixos pelo caminho habitual quando viste alguém ao longe a instantes de te cruzar. Levantaste o queixo, pois querias ser amável, fixaste a nuca caída de quem surgia e os lábios tremiam-te de antecipação. Ela levantaria o olhar mal pressentisse a tua sombra. Lá estava!, sentiu-te, ergueu-se e, por fim, ligaram-se os olhos num relâmpago. Mas, mal deste início ao árduo desenho do ténue sorriso que planeavas, os olhos de quem te lançou em tamanho trabalho cairam pesadamente no chão adiante. Apagaste depressa o pequeno rascunho de simpatia, quebraste a segurança da tua postura e, humilhada por não te saberes comportar cá fora, prossegues, para sempre invisível, pelo caminho habitual.

Talvez um dia nos cruzemos...

segunda-feira, outubro 02, 2006

Foste tu!

Eu?! Mas sou tão pura e honesta,
Com juízo em meu palmo de testa!
Tudo em mim é amor e humildade
Só procuro a paz e a verdade.
Sou tão amiguinha e tão prestável,
Tão compreensiva e muito afável.
Sou a sincera compadecida
Que pelos outros (quase) que dá a vida!
Como podes querer acusar
Esta pobre fada do lar?!
Quem julgas tu ser culpada
Da tua revolta amargurada?
Eu?! Que sou tão bem educada?

Amiga...
A Inocência não prova nada!


[para ti que me deste o mote, obrigada]
Queria tornar-me muito pequenina
- Como a minha letra -
Ser tão pequenina que não visse mais nada
senão esta folha branca
Que pudesse passear-me nela
E na ponta da grafite que aqui desliza
Que não soubesse ler estas palavras
E me deliciasse apenas com o seu desenho
Gostava de ser tão pequenina
Que o mundo não me visse
Que não soubesse que havia mundo
Que o mundo grande não existisse

Gostava de ser este ponto final.

domingo, outubro 01, 2006





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sexta-feira, setembro 29, 2006

Sente a brisa enamorada
beijar-te e morrer
ternamente. Esconde risos tristes e
puros onde recordas
passos e regras trocadas ousadamente.

Sopras-me para longe, incitas trovoadas.
Tens horas eternas
de instantes finitos, ficas enroscada, reescreves estorias novas com enleios.

Imortaliza nomes, nao ouses correr entre nuvens caídas e
pisadas, revi-te outra vez e soube
negar-te o tempo... Homem, intrigas nunca ganham.

[brincadeiras]
Tenho um amor especial. É um amor enorme, mas diferente do vosso. Não é um amor único, não é exclusivo de ninguém, gosto de o espalhar. Mas amo os escolhidos com a mesma força. O meu amor não precisa de ser correspondido, não precisa de nada em troca. O meu amor não é obsessivo. Quero apenas que os meus amores sejam felizes. Não comigo, não com o meu amor, mas com a sua vida, com o seu destino. Eu, e o meu amor, estamos apenas aqui para ajudarmos no caminho.
Essa gente que amo, por vezes encontra outro amor. O vosso amor. Sorri-me, acredita que vai ser feliz com ele, sorrio de volta, vejo nos seus olhos brilhantes que é possível. E, então, eu e o meu amor acreditamos no vosso amor e deixamo-vos amarem-se unica, exclusiva e obsessivamente. Os meus amores tornaram-se casais e eu sou muito feliz na felicidade deles. Eu deixo que alguém pegue nos meus amores e tome conta deles da forma que eles precisam e desejam, porque eu não lhes posso dar isso, não faria sentido porque o meu amor é diferente. E eu alimento-me desse amor verdadeiro, é a felicidade que ele traz que me mantém, e ao meu amor, vivos. O vosso amor consegue trazer algo aos olhos dos meus amores que eu nunca conseguirei trazer. Traz paz, certeza e um forte sentimento de pertença. E ao sentir isso através dos meus amores, o meu amor concretiza-se porque eles são felizes.
Mas há aqueles que, ao pegarem num dos meus amores, não sabem como cuidar dele. Podem não se aperceber do quão especial é o amor do qual estão a cuidar e descuidam-se. Não correspondem às expectativas, não tornam os meus amores felizes, magoam-nos e fazem-me sofrer com eles. E eu zango-me porque dei-lhes permissão para tomar conta de alguém que o meu amor tanto estima e não foram capazes de o fazer. Fico triste por toda a esperança que uns olhos brilhantes um dia me mostraram se diminuir tanto, por ver a felicidade que nos alimentava a todos desvanecer. O vosso amor não compreende o que pode perder por se ter descuidado. E isso entristece-me. Os meus amores não merecem sofrer com os vossos amores. Os meus amores merecem encontrar alguém que os ame como eu, mas que queira dedicar todo o seu amor unica, exclusiva e obsessivamente a um só amor. Os meus amores merecem ser reconhecidos. Os meus amores merecem ser felizes para sempre. Os meus amores não merecem menos do que serem amados. Os meus amores merecem ser mais do que apenas meus.
Feriram um dos meus amores. Espero que o saibam sarar...

segunda-feira, setembro 25, 2006

Vamos falar um pouco.
Chego à noite e arranjo sempre alguém que me faça companhia até eu adormecer. Ou deita-se a meu lado, olha por mim, ou deito-me no seu colo, onde me protege. E, antes de adormecer nos meus pensamentos velozes, falamos. Geralmente, sou eu que falo. Digo o que sinto, as minhas filosofias, sou capaz de me declarar e expôr, talvez chore e me abrace à almofada supondo ser a minha companhia, talvez me encoste nela só por me sentir feliz. Por vezes nem falamos. Fico assim, com o coração quente por não estar só. Porque, bem vistas as coisas, não consigo adormecer se não estiver em paz e a ansiedade que se acumula no peito por vezes é muito pesada.
Quem sabe, talvez tu já estiveste comigo uma noite destas. Ou mais.
Como surge o meu poema morto:

Sento-me
Preparo todo o material para escrever
Escondo a minha cara atrás das mãos
Sente, sente, sente
O calor no peito sobe, o amor aquece
É isto o poema, liberta-o
Retiro as mãos
Abro os olhos
Lanço-me na escrita
E fico assim...

imóvel

e o poema morre a escassos passos do papel.

quarta-feira, setembro 13, 2006

Irritam-me pessoas que escrevem muito devagar ao computador.
Irritam-me pessoas que se recusam a tirar fotografias.
Irritam-me pessoas que estão sempre a tirar fotografias.
Irritam-me pessoas catastrofistas.
Irritam-me pessoas que dão demasiadas lições de moral.
Irritam-me pessoas que suspiram muitas vezes.
Irritam-me pessoas que dizem dizem palavrões todas as frases.
Irritam-me pessoas que me pedem desculpa depois de dizerem um palavrão.
Irritam-me pessoas que acreditam que estão sempre doentes.
Irritam-me pessoas que dizem "eu sou assim" para se desculparem.
Irritam-me pessoas que dizem que a culpa é sempre do governo.
Irritam-me pessoas que só sabem dizer mal do seu país.
Irritam-me pessoas que falam como se esperassem palmas no fim do discurso.
Irritam-me pessoas intriguistas.
Irritam-me pessoas cegas pela sua religião.
Irritam-me pessoas como o Ricardo Reis.
Irritam-me pessoas que são falsamente diferentes.
Irritam-me pessoas que dizem "percebes?" muitas vezes quando falam comigo.
Irritam-me pessoas que não são capazes de decidir uma coisa simples.
Irritam-me pessoas que dizem piadas para serem considerados fixes.
Irritam-me pessoas pouco práticas.
Irritam-me pessoas que falam de um assunto sem saberem nada dele -armchair critics-.
Irritam-me pessoas que se recusam a escrever com uma caneta azul.
Irritam-me pessoas que desejam sempre algo que não podem ter nem lhes convém.
Irritam-me pessoas que me dizem os benefícios do alcool.
Irritam-me pessoas que não aceitam os gostos dos outros.
Irritam-me pessoas que gozam outras e não sabem parar quando lhes pedem.
Irritam-me pessoas que adoram mostrar que sabem mais que as outras.
Irritam-me pessoas que dizem "erm..." como se fosse tudo óbvio.
Irritam-me pessoas que chegam sempre atrasadas e não se importam com isso.
Irritam-me pessoas com a mania da conspiração e da perseguição.
Irritam-me pessoas fanáticas por uma banda qualquer. Histéricos.
Irritam-me pessoas que sabem tudo sobre futebol.
Irritam-me pessoas que não sabem nada de futebol.
Irritam-me pessoas demasiado previsíveis.
Enfim, irritam-me pessoas... Felizmente, sou uma pessoa muito tolerante!

[estas listas são giras, vou ver se faço mais]
Gosto muito de ti. Apetece-me dizer-te isto hoje. Como se tivesse bebido muito e o alcool me obrigasse a proclamar o meu amor. Preciso de um abraço teu, dar-te um beijo na face como nunca soube fazer. Queria olhar-te um longo tempo, sentir-me feliz por ainda estares comigo apesar do meu embaraço em certos momentos, e dizer-te nos olhos "gosto muito de ti". Gosto mesmo, ensinas-me muito, obrigas-me a ser mais do que alguma vez fui. Levas-me a ser feliz. Pegas em mim, dás-me corda e deixas-me voar. Ainda bato muito mal as asas, como vês, mas já vou tentando. E tu sorris-me de volta, encorajas-me, ris-te de mim e eu também.

Sabes, gosto mesmo muito de ti.

quarta-feira, setembro 06, 2006

Uma pessoa dá o seu melhor e ainda ouve coisas destas...
Uma pessoa cuida tão bem de si e depois acontece cada coisa...
Uma pessoa quer ser alguém e não a deixam...
Uma pessoa sente-se mal, mas a vida continua...

Eu dou o meu melhor. Não me olhem assim.

[Não te olhes assim, Laura.]

sexta-feira, setembro 01, 2006

Camões de T-Shirt

Era uma vez um poeta português
Chamava-se Luiz Vaz e era bom rapaz
Decidiu voltar ao seu país à beira mar
Depois de muitos anos longe dos lusitanos
Voltou a Lisboa, numa manhã muito boa
Em que o sol queimava e a gente aproveitava
Para passear as famílias e comprar
Souvenirs, prendas, roupas e merendas
Com quase nada, Luiz viu-se na Baixa agitada
E logo se espantou com o que encontrou
Tanta gente! Ninguém o vê, até que de repente
Um homem surge, diz que o tempo urge,
Que tem Sida, precisa de ajuda para uma ida
Ao tratamento, precisa de financiamento
Luiz não compreende, diz que dele não depende
Vai-se embora, segue rua fora
Vira na primeira esquina para fugir à menina
Que vinha na sua direcção com papéis na mão
"Só uma perguntita...", "Não, senhorita!"
Luiz sobe a rua, vê uma rapariga quase nua
"Nunca hei-de olvidar tanta pele ao ar!
Que roupa tão pouca, que criança tão louca."
Descobre entusiasmado os Armazéns do Chiado
E depois de se maravilhar com umas escadas a andar
Encontra o paraíso humano, o comércio leviano!
Vitaminas e Companhia, Sr. Frango à Guia
Sephora, 5 à Sec, Bijou, e o famoso Mac
Springfield, na moda, Intimissimi, cabeça à roda
Até que se descobre num lugar mágico e nobre:
A Fnac maravilhosa! Cheia de cultura tão saborosa!
Pediu ajuda a um rapaz jovial para ouvir música nacional
Deslumbrou-se com Donna Maria, Clã, Mesa, que alegria
Com Toranja, Pluto, Xutos, dançou como um puto
A Naifa, Amália, Mariza, o fado como sua nova poetisa
Estonteado com o poder que a música conseguia manter
Seguiu para a literatura, o expoente da sua cultura
Leu Queiroz, Caeiro, Garret, Saramago, um aventureiro
E que surpresa na poesia de mulheres como Espanca ou Sophia
Torga, Bocage, Pessoa... O tempo voa
E não pode ficar para sempre naquele lugar
Luiz sai de novo e admira o seu povo
"Olha o Camões de t-shirt!" grita um DZRT
"Aprende a cantar, rapaz!" aconselha-o Luiz Vaz
Segue a rua que sobe, à esquerda um pedinte com robe
Um homem com roupas estranhas que cospe fogo das entranhas
Até que encontra Pessoa sentado, seu novo amigo bronzeado
Mete conversa, não tem muita pressa
"Como está, amigo? Nem sabe o que se passou comigo...
Vim do céu eterno visitar o meu país moderno
Qual ouro, qual riqueza! Tanta gente, tanta surpresa!
Que vida estonteante tem este país impressionante!
Tenho de voltar mais vezes, como aqueles turistas ingleses
Alguém espera ansioso que liberte este lugar precioso
Deve querer uma fotografia consigo, meu caro amigo.
Não o incomodo mais, até sempre, saudações cordiais!"
E, seguindo a direcção do olhar do seu poema irmão,
descobre uma gelataria tão doce como Virgem-Maria
"Oh, que aspecto divinal! Quero um gelado monumental!"
E assim Luiz Vaz, a comer até não ser mais capaz,
Termina a sua viagem pela capital do seu país natal.

(Como vês, não foi assim tão difícil escrever sobre isto, é só preciso um pouco de imaginação;)... )

terça-feira, agosto 29, 2006

Já passou o efeito Paredes de Coura. Ainda permaneceu alguns dias, mas acabaria, mais cedo ou mais tarde, por desvanecer. Ficam as memórias, a que posso sempre voltar, e o desejo de repetir.

Já estava aquecida, os concertos desse dia foram bem vivos e animados, a vontade de gastar energias com pulos, danças e risos crescia. Esperava com expectativa o próximo concerto, mas nunca julguei vivê-lo assim.
Bastou a entrada dela em palco para me render. Bigger than the sound. Os gestos lentos, as danças livres, a voz determinada e marota, a presença dominante em palco, é impossível descobrir o que me seduziu. Não via mais nada. Começaram com uma das poucas músicas que conhecia e, ao contrário de todos os outros concertos a que assisti, bebia cada nova música como se não quisesse que terminasse, aprendia-a logo, não me limitava a ouvir o ritmo e dançá-lo, não esperava por outra já familiar, todas eram perfeitas para o momento. De certa forma, algo em mim já as conhecia. Estava a assistir a uma das minhas bandas favoritas do momento sem o saber, o choque de compreender isto durante o espectáculo ao vivo tornou o meu fascínio, que acabara de nascer, ainda maior.
A certa altura reconheço o início da música que mais ansiava por ouvir, mas que julgava que seria esquecida. Êxtase. O meu corpo salta sozinho quando a música lhe diz para o fazer. E eu sigo, pulamos os dois, qual de nós mais inebriado.
Sentia-me tão feliz. Não sei como consegui pensar, mas o que é facto é que o fiz. Estes dias tinham corrido tão bem. Senti-me tão livre, tão leve, sorri, olhei o céu, visitei, conheci, dancei, ri, toquei, senti. E ali, naquele concerto, tudo de resumia naquele momento em que me perdi em mim e na música. Começou a chuviscar, vi tanta cabeça cobrir-se - só me devo ter apercebido da chuva com esta imagem colectiva -. Não lhes segui o exemplo. Ergui a cabeça para o céu, deixei-o pingar sobre a minha face. É isto que Eu Sou. Estou a sê-lo. Esta alegria, esta liberdade, esta vida. Sentir cada instante como se fosse único - e não o é?! -, marcá-lo em mim, deixar-me ir, perder-me nele, ser sugada pela sua brevidade, deixar o peito arder por dentro. Isto é felicidade.
A música terminou e lá me rendi ao capucho. Por pouco tempo porque deixou de chover. Não faz mal, já tive o meu momento abençoado. Voltei de novo a minha atenção para ela. Mantinha-se no seu papel de extravagante e comandante de todos nós. De mim, pelo menos, seguia-a com atenção, se saltasse, saltaria com ela, se se tornasse louca, enlouqueceria com ela. Mas eu sabia que ela iria acordar para nós. Eu não era a única invadida por aquele espectáculo, aquela energia, aquele impulso para mexer. Ouvi-a rir-se. Já nos viu, já percebeu que não gostamos apenas de receber, mas adoramos dar algo de volta. Algo maior para que a festa seja geral. Ela deixou de ser apenas alguém em palco, ela está connosco, comanda-nos com o seu encanto peculiar e move-se connosco. Estamos todos juntos, quebrou-se o fosso que nos separava. Ri-te, canta para nós, dança connosco, you're something like a phenomena.
O concerto não termina nunca. Quero que este momento seja eterno. Observo-a e acredito que também não se importava de ficar aqui connosco para sempre. Canta-nos a sua love song. Absorvo-a tal como me é oferecida. Tal como todas as outras que já passaram. Estou cheia. Perdi a noção do tempo, sugar cada instante estica-o até ao infinito, dá-me a eternidade que queria. Estou feliz como havia muito tempo que não estava. They don't love you like I love you. E, agora sim, estou pronta para voltar.

terça-feira, julho 18, 2006

Três anos!...
Parabéns, meu amor!


(refiro-me ao blog... três anos no dia 10 deste mês... atraso-me sempre na mensagem de parabéns...)

domingo, julho 02, 2006

Surgiste de novo. Já te julgava enterrado, mas o inconsciente prega-nos partidas. Estavamos duas, segurava-lhe a mão para que não tombasse, protegia-a. Mas deixou de precisar de mim no momento em que ele chegou. Viu-o, deixou de me ver, deixou-me de mãos no ar, suspensas pela súbita falta da mão que cuidavam. Senti-me triste pelo seu abandono indiferente. Mas antes que tombassem agora as minhas mãos, que cairiam, de novo afastadas, junto ao resto do meu corpo seco, tu surgiste-me, sorridente, e a tua mão larga preencheu o espaço deixado pela outra. Seguravamo-nos os dois. Não disseste nada, olhavas-me, sorrias e voltavas a ser que um dia foste para mim. Não mais que um amigo, não menos que um encanto. O eterno mistério do teu olhar. As mãos eram as mesmas. Tão grandes e tão doces, escondendo as minhas que gostam de as explorar. Uma dança de mimos inocentes e sem futuro. Estavas comigo naquele instante e não estarias no seguinte. Eras aquele momento, eu sabia disso. Trouxe-te pelo novelo de mãos que tinhamos criado até um sítio mais recatado onde pudessemos terminar o instante. E como a solidão é densa e a inocência frágil, quis mais que mãos. Quis braços, quis peito, quis calor, quis esconder-me em ti, no ninho que criarias à minha volta. Joguei-me no teu abraço sem medir profundidades. Quis-te perto, fechei os olhos, segui-me pelo teu odor que não esqueço. Quis demais, não tomei cuidado, fui bruta e não te cheguei a sentir. Antes das minhas mãos te rasgarem as costas de medo, já tu tinhas desaparecido. O instante tinha terminado. Assim como tu e eu.

sexta-feira, junho 23, 2006

Já está tudo sabido
Quando tiver alguém para mim
Já sei que músicas lhe vou dedicar
AS líricas que lhe vou recitar
Os poetas que vamos conhecer
As flores que vamos colher
Já escolhi o que vamos dançar
Os lugares belos para visitar
Os sitios discretos para comer
E até as surpresas que lhe vou fazer
Sei ainda como os meus dedos
tocarão cada traço do seu rosto
Como os lábios lhe tomarão o gosto
Como a minha cabeça se acomodará no peito
Como se vê, tudo muito bem feito

O meu amor já está todo planeado
Faltas tu, meu bem, saires desapontado
Diz-me, meu bem,
Porque me queres assim?
Não sou livre
Não rio sem medo
Não falo sem pudor
Não danço sem amarras
Vês apenas o meu olhar
atento e sereno
escondendo algo de ti
É por isso que me queres?
Queres descobri-lo?

Meu bem...
Não queiras.

sexta-feira, junho 09, 2006

Tenho saudades deste blog.
Mas eu volto.
Prometo.

E antes que me volte a esquecer...

Um agradecimento especial para a Mina que me ajudou a modificar o banner do blog. Ficou bonito, não ficou? Resta que se descubra o porquê daquela imagem...

terça-feira, abril 25, 2006

Ele gosta de ti. Cheiras bem.

Apesar de ter vindo a escrever cada vez menos, estou com o pensamento sempre presente na escrita. Há tanta coisa que vejo, que sinto, que quero transmitir e tornar eterno, mostrar ao mundo para tentar saber se serei a única. The bliss.
Por vezes são cores. O céu ao anoitecer, as nuvens em fogo. Mas faltam-me os termos para as cores. Só conheço este. Vermelho. Ou laranja.
Ou então é um gesto mínimo. Um pé ou uma mão que se contorce num beijo. Um olhar perdido ou um sorriso escondido. Ou a minha mão a esconder o meu sorriso solitário quando vou sozinha na rua e a tirá-lo da cara, a puxar os cantos da boca para o seu sítio certo. Mas só conheço estes termos.
Ou o cheiro dela que me acalma e conforta. E ali fico, encostada, satisfeita, falando devagar e sem importância, porque me cheira a gente que estimo.
Ou aquela frase que me disseram, aquela lá em cima, que me soube tão bem. Ou um sorriso que me devolvem. Ou um riso solto quando não esperava.
Ou quando leio o livro da Katherine Mansfield e me descubro a rir sozinha, a sentir-me feliz por viver aquelas palavras mais belas que eu. E o inglês que me soa tão bem a ressoar na cabeça. How exquisite.
Ou quando oiço este album de Placebo que me estava mesmo a apetecer e me sento ao computador, pronta para escrever o que sinto e só me sai as líricas que oiço. E depois há estes solos de guitarra que não dá para escrever.
Ou quando vou ao blog da Mina e me sinto em casa. O fundo é tão acolhedor. Apetece ficar com a janela aberta imenso tempo, só a deixar o ambiente preencher-me.
Mas não sei.
Geralmente pergunto-me se é mesmo esta a minha arte. Talvez se me dedicasse ao cinema, por exemplo! Já me disseram, e eu até concordo, que gosto muito de descrever imagens, gestos. Talvez se escrevesse um guião (se soubesse como é) ou uma peça de teatro me sairia melhor. Mas faltam-me as histórias. Os meus pedaços são tão pequenos que não durariam cinco minutos em palco. Ou no ecrã.
Quem sabe, um dia.
Eu precisava de tempo para me sentar e não pensar em mais nada. Não consigo. Se reunisse tudo o que escrevi, analisasse tudo ao promenor, talvez encontraria um fio que seguir, talvez conseguisse juntar todos os pequenos pedacinhos, sem forçar, e saísse algo digno do que queria expor.
Como me disseram (como tu me disseste), a ficção não pode superar a realidade, não existe. Sim, é a minha realidade que me fascina e não as personagens que me surgem forçadas na cabeça. E era a minha realidade que gostava de transmitir, todos os pequenos pedacinhos, os bons, os maus, os secretos, os públicos, os podres. Mas não posso porque não vivo sozinha. Não sou eu que crio a minha realidade, são os outros que entram pelos meus sentidos adentro. E eu não tenho o direito de lhes tirar a intimidade e confiança que depositaram em mim. Complicações.
Como posso ser tão cuidadosa?!

Tenho uma pedra no coração.

domingo, abril 23, 2006

[um parágrafo que prometia mais... ]

Maria Candeias cheirava a amêndoa. Passeava altiva pelas ruas de Lisboa, envolta no seu casaco vermelho de lã em dias de Primavera, baloiçando a sua saia pelo joelho. Sempre de passo apressado, mas sem nunca perder a sandália solta no seu pé, aquela mulher alta conseguia passar despercebida aos olhos dos mais comuns pois os seus olhos não se prendiam a ninguém, não reclamavam atenção e seguiam sempre uma rua adiante, como se prevessem o passo seguinte.

[e não consegui continuar...]

terça-feira, abril 18, 2006

para Inês

Já lhes oiço a respiração compassada. Não admira, depois do dia de hoje o sono toma conta do corpo bem depressa. Não houve tempo sequer de soltar as cortinas, a escuridão é igual, mas um brilho frágil faz-nos companhia na sala. A lua espreita-nos. Vejo-a daqui, lá fora e no alto, gorda e amarelada, incendiada pelas luzes da nossa Terra. Não é lua-cheia, mas está a caminho. Está lua-botão. Sim, é isso, um botão redondo a sair da casa a que pertence no manto negro de veludo, salteado de estrelas pequeninas mas formosas. Um botão.
O sono ainda não me encontrou, por isso, sento-me para que me veja. A luz do botão aponta-me para dentro e ilumina-me a casa. Todos dormem, espalhados pela sala. O Pedro, no sofá, dorme de boca aberta e de mão pendente, a pouco mais de um palmo da cara do Zé. Talvez por isso ele esteja a dormir de testa franzida. Mais ao fundo, o casalinho dorme bem junto, testas juntas. A meu lado, a Ana parece uma boneca, bem enrolada no seu saco-cama, só com a cabecinha de fora e um sorriso discreto a decorar-lhe o rosto. Aqui perto ainda vejo os restantes dois vultos, mas estão tão aninhados que não os distingo. Adoro vê-los dormir.
Com cuidado para não acordar ninguém, serpenteio-me para fora do meu saco-cama e, em pezinhos de lã, saio para a varanda. Está fresco, a brisa marota sopra-me para dentro da camisa e arrepia-me as costas. Ao menos refresco-me, ali dentro estava demasiado abafado pelo calor do sono.
Estou sozinha. Ninguém me pede palavras ou sorrisos, ninguém me pede nada. Vejo o mar, não muito longe, ainda acordado. Oiço-lhe a respiração, o lamber da areia gelada, a queda de cada onda. Não se agita muito, sei-o porque a lua arrasta-se num traço indefinido sobre a água. E também, a lua e o mar, ambos frios.
Talvez se cerrar os olhos e respirar fundo deixe de ser este corpo por um instante. Não porque não goste dele, mas apenas porque me atrapalha às vezes. De olhos postos em gentes, admiro-os e estudo-os embevecida pela peculiaridade de cada cara, de cada gesto discreto, de cada relação. E, às vezes, descobrem-me.
Acordo sobressaltada, esquecida que também sou como eles, carne, gestos e dor, viva e visível. Ninguém deve gostar de ser examinado assim, por isso gostava de, ao fechar os olhos e respirar fundo, deixar de ser este corpo e poder observar gentes sem incomodar ou interferir. Mas agora todos dormem, já sou invisível.
Penso neles e essa memória traz em anexo em sorriso delicioso. Passámos um bom bocado. Faltarão sempre termos para definir os nossos dias juntos. Ao contrário de quando os observo, nestes dias senti-me parte de um todo, fomos todos um só entusiasmo, uma risada só, vivemos todos o mesmo e da mesma forma. É surpreendente descobrir o uníssono das nossas vontades, das nossas loucuras. Fomos loucos e soube tão bem. Livres. Vivos.
Agora dormem. Devoro-lhes agora o olhar. O Ricardo, ali no meio, tem um braço imóvel no ar e uma mão a deslizar vagarosamente ao longo do braço adormecido. Sono profundo. O Pedro vira-se para o outro lado, enrosca-se no sofá. O silêncio permanente ritmado pela respiração sonolenta da sala. E a luz da lua-botão beija o cabelo solto de todos eles.
Não quero sair daqui. Esta paz deveria durar para sempre.
Mas o tempo não pára. As memórias ficam, o tempo segue e desenha em nós memórias. No fundo, somos ingratos. O tempo foge, diz-se. Não, o tempo ri-se de nós. É o pai que nos acompanha pelo passeio e nós, crianças irrequietas, ou corremos muito depressa e, lá no fundo, temos de esperar por ele, ou detemo-nos a observar alguma coisa, a brincar com as pedras da calçada e, quando damos por nós, ele já lá vai longe, chamando-nos para que não nos percamos. Porque o tempo mantém o seu tempo. Nem nos acompanha na corrida, nem se detém connosco. Mas não se esquece de nós, chama-nos tanta vez para que não nos percamos de vista. Sem ele estaríamos sós.
“Por aqui?” oiço. A Sofia vem até à varanda. Deve ter ido à procura de petiscos e reparou na minha figura na volta. Com o olhar que só eu lhe conheço em momentos silenciosos, lê-me o aranhiço de pensamentos. Em silêncio, vêmo-nos assim, sozinhas numa noite azul, sonhando com tudo o que foi e o que será.
Tenho de lhe falar, que me pede.
“Onde estaremos amanhã?”. O nosso tempo pai já nos chama, parámos de novo, absortas neste instante, sob o luar de hoje, no fresco da noite, na penumbra do mar, no cheiro salgado, no sossego.
Sofia sorri-me e abraça-me como se abraça o tempo. Corremos até ele para não ficarmos mais para trás, abraçamos-lhe as pernas – porque ainda somos pequenas demais para chegar mais alto -, com muita força, para o fazer abrandar, mas, ao mesmo tempo, riamo-nos com a malandrice porque sabemos que ele é bem mais forte que nós. Ri-se connosco, arrasta-nos, alguns passos. Faz-nos cócegas para soltarmos a sua perna, é impossível resistir a este golpe.
Alegremente vencidos, libertamo-nos e estendemos-lhe a mão para que nos guie assim até á próxima corrida ou à próxima paragem no nosso percurso. Mas, por agora, de mão dada, sigo de mão dada com Sofia de volta para a sala onde o sono finalmente me encontra, me deita e, com um beijo de boa noite, me aconchega e me sussurra “boa noite, meu bem, descansa agora, amanhã estaremos um pouco mais longe...”.

sexta-feira, abril 07, 2006

posso agora talhar ruas imensas, casas imóveis, abandonadas
algumas nuas a morrerem assim, tristes, inquietas, azuis, sozinhas
mas isto não acaba
algures num alvor atado quando uma igreja nos ouvir
jorraremos o amor ousado
rasgaremos a imagem sem titulo
foge rato amargo, nunca consegues instalar-te sem coração ausente
corre ave terrestre, a rasgos isto não avança
ama, negro trovão, o nosso idiota orvalho
riscos a queimar um elegante lume
monstros ocultos no interno corpo ardente
inevitavelmente, nós estamos sós...

[nova experiência... quem perceber como surgiu este poema, avise]

sábado, março 04, 2006

(...)
Tenho amigos. Rimos juntos, choramos à vez, partilhamos horas e, de vez em quando, dizemos que gostamos muito uns dos outros. O que é verdade e sabe bem. (...)
Qual o nome para o calor no peito quando, no escuro de um quarto, vemos um filme encostados, cabeças pousadas os ombros de outros?! Ou um abraço num dia especial, ou num dia normal. Ou um beijo na face inesperado e doce. Ou uma dança sedutiva a alguém que sabemos que não se seduzirá, que se ri como nós do exagero dos movimentos. Ou quando nos apercebemos do génio de alguém e o queremos seguir e absorver tudo o que nos deixar beber. Ou quando nos despimos de cascas a alguém que pouco conhecemos mas cujo olhar nos é tão familiar e convidativo. Ou quando na solidão da noite nos imaginamos junto deles, de cabeça no seu colo, sabendo que nos protegem. Ou quando nos deparamos connosco nos gestos de outro. Ou quando desejamos escrever as palavras mais belas numa dedicatória que alguém tanto merece e julgamo-nos incapazes de as descobrir. Ou quando as lemos e a comoção afoga-nos os olhos. Ou quando as saudades apertam. Alguém conhece o nome desse calor no peito que sinto em todas estas ocasiões? E porque ninguém fala dele?
À falta de melhor... amo-vos.
[mais uma experiência]

Estou doente
Vê-me o meu corpo mole
Os olhos azuis cada vez mais despidos
E diz-me que estou doente
Quis ser poeta e olha onde estou
No ridículo
Numa perda de tempo
(o teste é já segunda)
o meu pai chegou.

sábado, fevereiro 18, 2006

Hoje. Felizmente, não tinha pensado muito no dia de hoje, não tinha planeado as minhas falas, ou mesmo as dos outros, como geralmente faço. Consegui escondê-lo do pensamento, consegui ser espontânea e viver um, e apenas um, momento daqueles. É agora e não posso pensar no que vou dizer. Vou ser eu.
Sei que ao subir estas escadas me vou encontrar com eles. Já não o vejo há mais de um ano (já passaram dois?), vou conhecê-la pela primeira vez. São ambos amigos, diferentes cumplicidades, mas os dois especiais. E nunca a vi… mas sei quem é.
Os olhos inquietos procuram o casaco negro que certamente ele trará. Encontro-o, estão ali. E, num momento, estou de frente para o casal. Sentados nas escadas, entretidos com o seu segredo. Acordam para mim. Sorrio-lhes. Ele continua igual, obviamente, não é pessoa de mudanças. E ela… é quem eu sabia que era. Ao primeiro relance, vi-lhe desenhados no corpo os contornos dos seus desenhos. Era quem me tinha apresentado, “esta sou eu, desenhada por mim, com os meus traços, com as minhas mãos” e, sim, ela sabia quem era. Vi-a, num instante apenas, nua nos seus traços como se me apresentou. Então é ela…
Formalidades cumpridas. Subimos para uma conversa à mesa. Sentei-me à frente dos dois. E conversámos. Receava (ao subir as escadas, instantes antes do encontro) de me envergonhar, de me conter, de me fechar como é costume, mas, incrivelmente, sentia-me tão bem junto deles que o à-vontade falou por mim. Foi bom revê-lo e ter uma voz a lutar comigo contra algumas das suas ideias que sempre julguei indemolíveis. E foi bom conhecer essa nova voz (não tem pronúncia, era a minha grande curiosidade) que se dirige tão naturalmente a mim, segurando-me com os olhos, fixos nos meus, ligados. Quando o diálogo era entre nós as duas, os olhos de ambas prendiam-se, admirando-se mutuamente, segredando acrescentos às palavras cruzadas. E o sorriso convidativo…
Mas houve algo mais que me fascinou. Os casais nunca me convenceram. Nunca me levaram a acreditar num sentimento sincero, puro, eterno. Nunca vi naqueles beijos chupados almas cruzando-se, mas apenas línguas, carne, fluidos. Os toques nunca foram para mim profundos, apenas superficiais, fúteis, mãos cheias de corpo e vazias de alma e entrega. Carência cega e mimada. Fome.
Sabia que ele e ela estavam juntos, mas não sabia como. Cada pessoa tem o seu modo de se relacionar e não sabia como o deles funcionava. E fiquei enternecida.
Nunca vi um casal tão perfeito. Com as pernas enleadas, a dela por cima da dele, irrequietas. Por vezes, surgiam brigas inocentes pela posição, sorriam-se, brincavam até encontrarem novo apoio com gestos cobertos de ternura. Partilhavam um afecto tão grande, nada cego, autêntico. Como se fossem realmente um só corpo, vivo, comandado por duas almas, não gémeas, mas siamesas, presas pelo mesmo corpo.
E o que mais me estranhou não foram estes mimos, foi o facto de não me sentir a mais. Não me senti, obviamente, parte daquele conjunto, mas a natureza daquela união já não tinha necessidade de atenção e resposta mútua, era algo tão impregnado neles que tornava as suas brincadeiras de pernas debaixo da mesa tão banais como um sacudir de cabelo quando se aventura em frente aos olhos.
Mas nada disto me derrubaria as ideias se não fosse aquele momento… Nem me recordo já do que estávamos a conversar na altura pois, mal se começou a desenrolar, apaguei tudo o resto para o seguir.
Era ele que me falava. Provavelmente sobre os seus ideais que sempre o caracterizaram e que geraram fascinantes discussões entre nós. Enquanto falava, tomei atenção a ela. Ouvia-o também, atenta como sempre se mostrou. Vagarosamente, pousa a mão na curva do braço dele apoiado na mesa. Sinto-a, vai-se instalar. De sorriso tranquilo, embalada pelas palavras que já não oiço, afaga o braço dele com a mão que lhe resta. E, aquecendo-me repentinamente no peito, deita delicadamente a sua cabeça naquele braço afagado, no ninho que aconchegou havia instantes e onde, agora, de olhos fechados, sorria, confortável.
O amor é isto e nada mais, soube-o naquele instante. O conforto, a cegueira dos olhos cerrados, a confiança naquele nicho, segurança, calor. Sei que ela sentiu também no seu peito o calor, a forma que o corpo tem de nos dizer que está bem. Confortável. No conforto acreditava. Percebi ali, amor é conforto. Afinal… sempre existe!
Talvez nem ele nem mesmo ela se tenham apercebido deste pequeno instante, como disse, os seus gestos afectuosos já eram de tal forma naturais que poisos destes não seriam tão raros que merecessem anotação. Não, o conforto deve ser permanente. Não os queria acordar daquele momento, procurei acordar eu, voltar às palavras dele, ver-lhe de novo a face, a boca que me falava, os olhos que me buscavam. Devo ter voltado a tempo, o discurso não tinha sido interrompido, logo, não se deve ter apercebido da minha alienação momentânea pelos gestos. Finjo esquecer o sucedido para retomar o diálogo.
O tempo passa, efectivamente, depressa. Os dias acabam, as horas terminam. Chegou a altura de me despedir deste meu casal amigo. Deixamos a mesa, afastamo-nos para um sítio mais espaçoso onde corpos desconhecidos demasiado perto não perturbem as últimas palavras de hoje.
Estou, de novo, de frente para o casal, ela do lado esquerdo, ele do direito. Curioso como, agora que deixo por escrito, me apercebo da importância e beleza do lado de cada um. Ela, a artista, do lado da criatividade, da imaginação, do coração; ele do direito, que, de acordo com os seus princípios e valores, não poderia estar mais correcto. Mas adiante…
Decidi despedir-me dele primeiro, afinal é aquele que conheço há mais tempo. Tive saudades dele, da forma como me abanava determinantemente para eu reagir, sempre com uma presença segura e amiga, mostrando-me não o caminho mas todas as alternativas. Ele olha para mim, julgo que descobriu a pessoa feliz (por vezes) que ouviu havia dias ao telefone. Depois deste encontro, não deixaremos passar tanto tempo até ao próximo reencontro.
Pouso agora o olhar nela. Sorri-me com a cara toda. Ainda bem que decidiu vir, os nossos receios de um encontro após algum tempo de convívio virtual, o medo da desilusão, do desencanto, estavam felizmente postos de parte. Vejo-lhe na cara o espelho da minha satisfação por nos termos conhecido. Repetiremos, sem dúvida, este encontro.
E, porque o tempo não pára, despeço-me finalmente dos dois, que não supõem sequer que a amiga que ali os deixou acordará confortável no dia seguinte graças ao amor que provaram ser possível.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

I'm an idiot. Era só para dizer isso...

As pessoas que não conhecemos pessoalmente não deviam falar à nossa frente. Isto porque de vez em quando descubro personagens magnificas sobre as quais começo a imaginar personalidades, vidas, qualquer coisa de fascinante sobre elas.
Como aquela rapariga de olhos enormes em Medicina. Que usa saias e botas, cabelo muito encaracolado, apanhado atrás. Parece uma bruxa, e não no sentido de feio ou mau, mas sim num sentido de fazer poções e feitiços. E o olhar é o mais fascinante. Olhos enormes, muito abertos, sobrancelhas pesadas, um olhar eternamente desconfiado. Não sorri muito.
Até ao dia que a oiço conversar com alguém e toda a magia se perdeu. E no outro dia dirigiu-se a mim, riu-se (sorriu) da minha piada. Já não é a bruxa misteriosa que via nela, mas não deixa de me atrair.
Ou o outro rapaz que também considerava muito curioso, de cabelo pelos ombros, barba por fazer, ar perdido. Até ao dia que me meti com ele e falámos. Tem uma voz muito bonita, foi o que recordei dele. Mas não está perdido, já tem um bom grupo.
Talvez eu julgue inconscientemente que essas gentes estão sozinhas à espera que eu pegue nelas e as cuide, só minhas. E esqueço-me que são gente viva que não espera por wannabe poets que lhes dêem um rosto novo, uma personalidade certa.
Ainda há uma personagem que nunca ouvi a voz, que nunca se deu a conhecer para além do que vejo sempre. É o "nosso amigo" do comboio. Um homem que corre sempre, sempre!, para o comboio, mesmo que esteja 15 minutos adiantado e que se senta sempre, sempre!, no mesmo lugar. Entra em pânico quando está ocupado. Nunca presenciei uma cena dessas, mas já ouvi relatos. Vai o caminho todo a fazer Sudokus. E quando sai da estação, também sai sempre, sempre!, a correr. Sobe as escadas (rolantes, ou não) a correr.

Enfim... vidas.
(próximo post é o 100. Estou a guardá-lo para um texto que tenho aqui. Espero que o mereça.)

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Tenho os pés gelados e ninguém para mos aquecer

E uma vontade enorme e escrever
Falta-me o jeito, falta-me o tempo
Falta
O peso das costas na responsabilidade
de ser o que desenhei
e desenharam
por mim
para mim
De repente
,

os olhos rasgados
pela lâmina da luz azul
Porque vivo numa casa tão estranha?
azul ou rosa
para que serve a cor se não muda
se se acomoda
nem padece
nem apodrece
nem aparece
se a pudesse
desligar...


(não devia ficar tanto tempo sem escrever...)