quinta-feira, dezembro 28, 2006

Não somos um só. Não nos fundimos, não esquecemos o resto do mundo, não morremos um pelo outro. É tudo mentira. Não somos um filme de cores torradas e gestos lentos. Não nos vejo de perto num calor único e eterno. Vejo-te apenas a ti, demasiado perto para te reconhecer. Vejo a ponta do teu nariz e os pêlos da tua face a nascerem discretos. Estás demasiado perto, não consigo ver o mundo. E agora, meu bem, acabou-se. Vim ver como seria se tudo fosse como no ecrã e descobri que não é. É mentira. Não há certezas nem eternidades, não há promessas loucas nem pureza nos actos. Eu tentei embriagar-me no que me faziam crer ser real, mas não chegou. Adeus, meu bem. Afasta-te depressa para que não veja mais o nascimento vagaroso dos pêlos da tua face. Afasta-te para que veja de novo os teus olhos num contexto de cara e os possa fixar e dizer-lhes palavras sinceras de amizade. Afaste-me um pouco mais para que veja onde estou e quem me esperava aqui perto. Se estiveres longe o suficiente, sou capaz de te mostrar aquilo que sempre foi meu e que, por pouco, ia perdendo. O meu coração arde, mas não é por ti. Não é por este aperto sufocante. É por eles. Alguns deles. São eles que me dão vida, que me constroem e destroem, são o que os filmes confundiram por essa exclusividade. Podias um dia ter-te tornado um deles, se ao menos não te tivesses chegado tanto. A culpa não é tua. Também quis conhecer algo mais – porque falam tanto?! –, mas não sabia que era aqui que devia procurar. Hoje compreendo. Adeus, meu bem, vou voltar para eles. Fico só, sim, mas se fizer o que tiver de ser feito por eles, fico bem. E eu nunca te chegaria. Adeus.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

Poemas/Prendas de Natal

Sabes porque chove?
Não, o céu não é egoísta
nem o mundo te quer mal.
Chove porque chove,
Porque o dia assim o pediu.
Enrosca-te no calor da casa,
Fecha os olhos e sorri.
Chove porque chove
E a vida espera por ti.


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Não existem sonetos,
nem quadras, nem rimas,
Que compreendam a alegria
de rever o sorriso saudoso
Que rompe distâncias
e torna o tempo moroso
Fica comigo esta tarde
Num café onde possamos rir
Vamos revistar as nossas vidas
Hoje não temos que sair


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Se o dia despertar negro,
Recorda beijos de olhos cerrados
Se receberes palavras árduas,
Saboreia melhor as doces
Se chover onde estás,
Dança ao som de Jobim
Se te sentires só,
Já sabes, chama por mim.


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Há quem se conforte apenas
Nas memórias doces de um tempo passado
Há quem se afogue na mágoa falsa
De não ser mais que um baú encerrado
Mas há quem conheça outra fortuna,
A das horas e dos dias abertos,
Onde se declaram sonetos de amor
À vida, ao Ser, aos prazeres secretos
E tu, que oiro possuis?

terça-feira, dezembro 26, 2006

Reflexões sobre o Natal e Ano Novo - ano 06

Este ano decidi acreditar que cada desejo de boas festas apregoado em cartazes nas ruas, em anúncios de televisão, em centros comerciais e por aí adiante se destinavam mesmo a mim. Quis parar para ler bem o que lá estava escrito e pensar, foi para mim que o escreveram, pensaram em mim quando decidiram desejar as boas festas. Sinto-me logo mais bem disposta.
E posso falar de prendas, outra vez. Acho que só este ano me apercebi exactamente do negócio. Isto porque no dia em que decidi dedicar-me a arranjar as prendas que gostaria de oferecer encontrei coisas muito engraçadas, mas apercebi-me que eram apenas engraçadas porque eu precisava de arranjar prendas e que não seriam minimamente úteis ou significantes fora da época. Há realmente coisas muito engraçadas nesta altura, aí está o negócio. Portanto, fiquei muito deprimida nessa altura e decidi revoltar-me. Não comprei prendas para quase ninguém. Tive outras ideias...
Chegaram as vésperas e deu-me uma vontade imensa de dizer a quem estimo o quanto gosto delas. Quis abraçar gente que nunca tinha abraçado antes (e porquê?). Eu sinto o espírito de Natal, o meu espírito, que pode ser bastante diferente dos outros. É para se dizer o quanto se gosta das pessoas e estar em família, não é?... Sim, disse a algumas das pessoas a quem queria dizer. Não abracei nenhuma delas.
E chega esta altura e começamos a rever mentalmente o ano que agora termina, já que não podemos analisar bem o que vem aí porque só vai começar agora. Este foi um bom ano. Bem melhor que o ano passado, que foi terrível para mim. Lutei por algumas coisas, consegui algumas, outras serão terminadas no próximo ano e poucas ficaram para trás. Estou satisfeita.
Tinha pensado em fazer aqui uma selecção dos melhores concertos deste ano. Fui a muitos, nunca tinha ido a tantos e tão importantes. A música é muito importante para mim, cada vez me apercebo mais disso. Um concerto hipnotizou-me completamente pela novidade, pela energia, pelo local, pelo contexto, por tudo, deixei de fazer sentido por uma hora e tal. Noutro concerto cumpri uma grande promessa feita a uma menina pequena há já dez anos. Saltámos e vivemos as duas juntas, não uma vez, mas várias, e agora a minha pequena amiga já vai descansar melhor e sentir-se mais feliz e real. Ela chorou, pobrezita, quando se sentiu real. Foi muito especial para nós. E, finalmente, no concerto da minha vida (acho que posso dizê-lo), revivi uma altura muito importante para mim, entreguei-me às memórias, às descobertas, às vivências intensas dessa época. Esse tempo é, talvez, o maior responsável por aquilo que sou hoje e a música recordou-me o quanto estou grata por isso. Estou tão grata. Vivi tanto aquele concerto, nunca me tinha acontecido. Calculo que saibam os músicos presentes em cada um destes concertos que referi...
E, finalmente, a escrita. Este ano foi tão importante para a afirmação da escrita como a minha arte (cada um tem a sua, digam o que disserem). Acredito que me descobri de novo na poesia (e tenho de agradecer a uma pessoa em especial que inconscientemente me "obrigou" a redescobri-la) e a prosa está pronta para ser testada em termos mais seguros e determinados. Termino o ano com vários projectos promissores em mãos e que me trarão novas revelações. Queria contar-vos tudo agora, mas não posso, é tanto e tão importante que prefiro guardar a surpresa para o momento oportuno. Espero que o próximo ano me traga muitos desses momentos.
Concluindo... dei muitos passos em frente este ano. Não posso parar agora. O ano é muito grande, há muito a fazer, há muito a evoluir e a conquistar. E estou a sentir cada palavra que aqui escrevo.
Páro agora para pensar em todos os que sei que passam por este blog. E, agora que já vos revi, desejo-vos (porque sei quem são) um ano 2007 tão formidável como se compromete hoje a sê-lo. Fiquem comigo, celebrem-no comigo quando chegar a altura. Carpe Diem.
Até muito breve,

Laura Brown

sábado, dezembro 23, 2006

Agora tem de ser segredo, se alguém me apanha estou tramada. Tenho de estar com atenção, não posso cair no erro de dar pistas. É tão difícil esconder um sorriso, felizmente ninguém volta para trás para confirmá-lo. Oh, vida, quem diria... Dizia eu, todos os dias, para me poder levantar da cama e seguir pelas horas adentro à procura da Hora. Não sei se já chegou, mas é algo novo. E é segredo. E é medo, e é terror por não saber ser, por nunca ter sido, por não saber fingir saber ser. Medo precoce. Mas tenho sempre o sorriso inconsciente e o sinal atrás da orelha.

domingo, dezembro 10, 2006

Eu explico:
Eu tenho escrito, sim, não me esqueço disso. Só que o que tenho escrito são coisas para projectos específicos e que não posso pôr aqui. O último post foi apenas um texto que escrevi para não deixar este blog muito tempo sozinho. Eu prometo que até ao fim do ano eu ponho algo decente, mas preciso da vossa compreensão para esta ausência incómoda. E também fica prometido que assim que tiver os tais projectos terminados, bem bonitos e arranjados, eu mostro aqui! Até lá...

Laura Brown

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Filo fax. Hora de sair de casa, já com algum atraso. Tranco a porta antes de ir andando para ter a certeza que não me esqueço das chaves. Volto a entrar antes disso para confirmar se o gás está desligado. Agora sim, desço pelas escadas, fecho a porta do prédio que quase de certeza está aberta. Subo a rua. No café, lá está a senhora de idade sentada na mesma cadeira, à mesma mesa, a olhar para quem passa, com os pés em cima da outra cadeira e com um café por perto. Pela roupa que traz, bem que poderia estar em casa. Talvez esteja. Continuo a subir. A escola primária está cheia de crianças eléctricas. Os rapazes assustam-me com algumas brincadeiras que têm. Não há tempo para olhar para as inocências a serem quebradas. Primeira passadeira, não costuma vir ninguém, segunda passadeira, não desvio o olhar enquanto não chegar ao outro lado. Continuo a subir. Terceira passadeira, a mais assustadora. Há carros que não param, há carros que ameaçam parar, há carros que param muito em cima. Geralmente começam a parar lá atrás, mas só avanço quando tenho a certeza que estão a dar-me passagem. Paro a meio para ter a certeza que não vem ninguém na segunda faixa, para que não aconteça como certa vez. Passei finalmente. Primeiros semáforos. Vermelho para mim. Olho para as horas expostas na rua, 9:53. Estou a tempo. Olho para o ecrã também lá perto, vejo as notícias e o cartaz. Os carros à minha frente param e avanço até à próxima faixa que está a andar. Está verde na passagem seguinte, infelizmente tenho de esperar que estes muitos carros parem. Cá está, verde finalmente para mim e o seguinte, que há pouco estava verde, fica vermelho. Carros da direita passam à minha frente, eu espero, não há pressa, tenho tempo. Fica verde para mim, mas ainda há carros a passar, uns poucos. Passei a estrada. Quarta passadeira, costumam parar. Chego à entrada lateral do hospital, digo “bom dia” ao segurança (ele fica tão contente, responde com um “bom dia” muito seguro e sério, mas no fundo, no fundo, sente falta dele quando eu não levanto a cabeça). Camiões a entrar e sair do hospital por aquela porta, tenho de lhes dar prioridade porque o espaço é estreito e não quero meter o pé na lama. Subo o caminho pela esquerda, chego a parte do estacionamento. Vem o cheiro às laranjas que estão nas árvores por ali espalhadas. Sabe bem, para contrastar com o cheiro a escape de há pouco. Vou pela estrada alcatroada para não ficar com os sapatos sujos. Há poças de água e carros na minha direcção, mais uma vez dou-lhes passagem porque não quero pôr o pé na água. Não há problema, chego a horas. Quando existe finalmente passeio do meu lado esquerdo, subo para lá e sigo, já sem contratempos, até ao Edifício. Gente a fumar à porta, de bata e ar novo, mas maduro. Alguns conhecidos dispersos dentro do edifício. A sala está aberta, olho o relógio na parede da esquerda, 10h em ponto, entro na sala e começa o dia.