Depois enamorei-me. Chegou quem não tinha medo de me abraçar. Sorria-me, olhava-me com amor transbordante e jogava-se no meu corpo. Ensinou-me a aceitá-lo. A senti-lo. A deixar-me tocar, inteira, corpo com corpo, num encaixe perfeito. Repetidamente até compreender que amava. Que pertencia. E, depois, ensinou-me a não ter medo de tocar. A juntar a mim o corpo do outro que estimo, a envolvê-lo em braços juntos, mãos abertas,gestos doces. Aprendi que o corpo fala. Aprendi que o outro estima o toque, que o compreende, que nele se conforta. Tal como eu própria aprendera a sentir, quando o embaraço se ultrapassa.
Desde então é tão mais fácil. Reconheço quando o meu corpo é impelido a tocar um outro para tornar a amizade e o carinho mais palpável. Demoro a transformar o desejo em ato, mas, quando me permito aproximar-me, sei bem onde colocar o corpo, os braços, o mimo. Sei já o que dizer no gesto. Sei já que não há outra forma de o dizer.
Porém, falta-me ainda definir o tempo certo, a dose adequada. Há uma comoção transbordante que tento conter, com o receio que o outro se surpreenda com a entrega. Deposito a minha fé na reciprocidade, mas receio, no fundo, a sua ausência. Talvez por isso adie o gesto até a comoção transbordar e o limite ao tempo indispensável para que o recado seja entregue.
Hoje, um abraço trouxe-me mais que um recado de amizade. Demorado, quis confortar, quis dar-me tempo e um refúgio. Mais que um postal, foi prenda de aniversário. E compreendi que me falta ainda esta derradeira aprendizagem.
Um abraço é corpo e é tempo. É preciso demorá-lo.
Sem comentários:
Enviar um comentário