[escrito em Dezembro, desculpem a demora]
(quase uma da manhã, não posso escrever muito… mas cá vai)
Debaixo do pessegueiro. Cá estou, entre os laranjas e amarelos do ar de campo e entre o pólen e dentes de leão que vagueiam neste fim de noite. Estou à espera sem pressa, as cores não vão mudar por agora. Há tempo e há paz e há conforto neste tronco de pessegueiro. Estou só à espera, mas sem ansiedade. Pode não vir, o que quer que seja que eu espero, que não me vou aperceber. É um sítio bonito para estar e eu sorrio porque cheguei aqui e me sentei por baixo do pessegueiro.
E é isto. É um passeio pela madrugada das ruas que já bocejam. É arriscar pela rua da esquerda porque nos lançou o desafio. É sentar no banco do jardim e ver o céu limpo de farrapos. O amor verdadeiro surge assim, numa guitarra amadora e no gato que te espreita no estacionamento do hospital. E eu avanço sorridente porque o vi quando mais ninguém estava a olhar.
E vou esperar junto do pessegueiro porque é lá que vai ter o que espero. Não há mais restaurantes ou pequenas salinhas preenchidas com páginas de letras coloridas e imagens produzidas para esperarmos sós. Não há este amor nos locais intermediários, no intervalo do que se julga viver. Terminaram os tempos mortos. Eu espero aqui num tempo vivo, num sorriso dinâmico. Não evitaram sucumbir as músicas de elevador para nos distrair do fundo oco onde nos arriscamos. Ficaram estes sons, os autênticos, os que nos fazem companhia na espera porque esperamos no sítio certo, onde já existiam e se alastravam. Não há cá fingimentos.
Podes vir que eu posso estar à tua espera para me vires buscar. Sabes onde te esperam? A sombra do pessegueiro é isto. Gostava que estivesses ao meu lado para me confirmares isto. Debaixo do pessegueiro escrevo o amor verdadeiro. O baloiçar com uma musica sussurrada. O olhar seguro e cruzado por entre a luz quente que as cortinas novas trouxeram. O rebolar na areia até à agua e parar para ver uma gaivota cruzar o teu azul favorito. A mão cúmplice que se junta à tua. O olho emocionado e a surpresa completamente inesperada que te obriga a encostares-te à mesa por estares a tremer. A voz que, por alguma razão misteriosa, ressoa em ti e te suaviza. O amor verdadeiro, enfim, este laranja à minha volta que parece feliz por fazer parte desta conversa enquanto espero.
E eu espero aqui por ti. Ia daqui para uma sala de cadeiras fundas e ecrã cinzento ver a projecção correr no pó sobre a minha cabeça, e ouvir a máquina tossir, receber de braços abertos o que me oferece com trabalho e satisfação. Queres vir, certo? Vai saber bem.
Fico por aqui neste escrito que a espera pode ser longa ou curta e há que aproveitá-la. O amor verdadeiro é isto, sabes?, é Ser. E eu sou debaixo deste pessegueiro.
Ai… true love is a trip to Chinatown. Who knows?
Estou aqui a sorrir-me.